domingo, 15 de maio de 2016

Traduzir o mundo com palavras

Apenas uma pequena reflexão
Outro dia pensei na possibilidade de alguém, um sujeito qualquer, entrar numa viagem de absoluta fissura por alguma coisa, uma louca obsessão por algo, que gosta imenso de fazer, que sempre buscou, procurou e tentou fazer e não conseguiu. Dificuldades imensas impediram resultados favoráveis. E que, de uma hora para a outra, se pega captando e tendo ideias; ideias que surgem em profusão, surgem do nada. Intuições, ainda não sujas pela linguagem verbal, que passam como relâmpagos, súbitas sacações, tudo muito rápido, se não consegue fazer um registro rápido, que capte e indique os seus sinais, babau. Perde a ideia para sempre.

Pode voltar a passar por uma onda parecida, mas será outro momento no tempo, que transcorre, flui, passa rápido, e nos envelhece mais rápido ainda, além da alteração de toda a cena do crime. A fartura de ideias empodera o nosso personagem, que cria coragem, para voltar a fazer novas investidas em sua paixão no fazer, em sua arte. Põe-se novamente em atividade, em intensa atividade, como se trabalho fosse, pois cada dia que passa, a dedicação só aumenta. Se fosse possível imaginar um homem completamente apaixonado pela arte da escultura, que por “n” razões, não pode efetivar a sua arte durante muito tempo da sua vida, e quando já começava a pensar que aquilo não fosse mais pintar, mais do que de repente, num determinado dia, pega-se em pleno transe shamânico com o seu fazer, com o prazer de estar fazendo, realizando, inventando, criando, transformando ideias em objetos, criando linguagens.
Mergulha de tal forma naquele fazer, que sua vida muda, passa a ser aquilo que faz, quase um mergulho total, naquela atividade, naquela ocupação, naquele trabalho. Passa praticamente toda a sua jornada, ocupado com o trabalho de esculpir diferentes materiais, a tentar criar uma linguagem visual e plástica, dar forma a uma ideia súbita, que comunica uma mensagem determinada, não importa qual, que transmite, comunica algo. Logo, a atividade do escultor, com o uso que é feito dos materiais, possibilita que o artista dê seu recado sobre o mundo, os homens, a política ou qualquer outra coisa do cotidiano concreto. De uma forma ou de outra, consciente do conteúdo da mensagem ou não, não importa, um artista através do seu trabalho, na manipulação dos materiais que usa, interpreta o mundo onde está inserido e imerso. Haverá quem encontre outras formas de expressão. O resultado final do trabalho, da dedicação aplicada na busca de chegar ao objeto pensado, idealizado, e finalmente realizado, é expressão desse mesmo mundo.
É como se o mundo, vamos pensar agora numa ideia maluca, como se o mundo tivesse vontade, e quem sabe, de repente até tem, a vontade e o desejo de se expor, de exprimir-se de alguma forma, particularidades do mundo querendo vir à tona, querendo se expor, se apresentar, aparecer, surgir, emergir, não importa de onde. Como somos originalmente natureza, uma natureza que se fez homem, construiu consciência, conquistou liberdade e adquiriu subjetividade, de certa forma estamos dando nossa contribuição, dando de volta, em pagamento ao privilégio de saber que fazemos parte de tudo isso, e por essa razão somos e fazemos a mediação daquela necessidade de exposição e expressão do mundo, como se o mundo estivesse precisando se expor, e o faz através do homem, homem mediação, homem parte do mundo, natural e cultural, que se fez homem criando e ampliando arte, engenho, conhecimento, saberes e cultura, que gera por sua vez, mais consciência e compreensão desse planeta em trânsito e em transe permanente.

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