quarta-feira, 8 de junho de 2016

Brockwell Park


No verão de 1982, estava passando uma temporada em Londres, Inglaterra. Cheguei logo depois do fim do inverno, como era a primeira vez, não tive coragem de encarar um inverno europeu em sua plenitude, então evitei chegar no auge do inverno, mesmo assim, quando pus os pés no Reino Unido, ainda fazia muito frio, com temperaturas com o termômetro muito longe de qualquer coisa, que já tivesse vivido antes. Dessa forma, torci muito para que a chegada do verão não demorasse. Quando finalmente chegou, já estava morando no bairro do Brixton com alguns amigos franceses e italianos, no lado sul do rio Tâmisa, distrito de Lambeth, muito perto portanto do histórico centro velho de Londres,


tanto que hoje essa região está completamente valorizada, em comparação com a época em que lá residi. Alguns chegam a dizer, que a região está passando pelo que se chama agora de gentrificação, o que é péssimo, porque esse movimento de valorização e encarecimento vai acabar expulsando muita gente do bairro, gente que era a alma do velho Brixton desde o fim da segunda grande guerra. Quando escolhi Londres como destino, tinha alguns objetivos em mente, como melhorar o conhecimento da língua do país, estudei inglês em duas escolas diferentes, além disso buscava me fortalecer psicologicamente, para tentar encontrar outra maneira de ganhar a vida, em algo diferente do que vinha fazendo até então, e não gostava, queria mudar, fazer outra coisa.



Aberto para o novo experimentei várias coisas diferentes, como fazer figuração em grupo teatral, dança contemporânea, back vocal em bandas pop, modelo vivo em escolas de arte ou em estúdios de desenho animado, cumim em restaurante, e até voluntário na área de saúde mental, com esquizofrênicos, uma barra total, que não consegui segurar, porque a teoria na prática é outra. Foi quando entendi a razão, de tantos psicanalistas cariocas recusar atender em consultório gente muito torta.



Como estava em processo de mudança, já estava portanto em viagem, e também por estar em outro país, outra língua, comida, arquitetura, outro clima, etc. Considerei não haver momento melhor e mais oportuno, para fazer o teste do Ácido, que já havia feito no Brasil, só que agora seria sob supervisão de um profissional maduro, sério e respeitado no pedaço, que daria, como fez depois, todo o suporte posterior, para destrinchar o material, que porventura viesse à tona durante o teste, e que não é pouca coisa, um desafio e tanto, principalmente para quem, se encontrava fora do país de origem, etc.


Apesar dos riscos, resolvi encarar e apostar na experiência, precisava tentar alguma coisa, porque buscava uma mudança radical. Então parti para a primeira experiência lisérgica em terras britânicas em pleno verão londrino, durante o mês de julho, com Dr. Huxley, que tinha acesso ao material procedente do Laboratório Sandoz na Suiça, que usava em pesquisas de ponta com pacientes terminais e outros.



Tomei o AC em sua casa de Hampstead por volta das dez da manhã, onde fiquei durante toda aquela jornada, com ele me acompanhando e estimulando, gravando algumas coisas que dizia, etc. Por volta das cinco e meia da tarde, achou que já estava legal, para voltar para casa, então me liberou. Quando cheguei na rua não estranhei muito, não era muito diferente de quando fumava um haxixe mais forte e concentrado, também já havia se passado quase seis horas que tinha tomado o AC. Sentia-me seguro e forte em meio a desconhecidos, sabia onde queria chegar, e assim cheguei em casa ainda claro, porque era verão, onde os dias claros permanecem até quase dez da noite. Em casa encontrei um amigo francês, que estava curioso a respeito do teste do Ácido, contei algumas coisas, mas queria muito sair, voltar para a rua, ir até um parque, que tinha perto, o Brockwell Park, para onde me dirigi a pé e só. Lembro ter caminhado muito dentro do parque, que àquela hora começava esvaziar, havia alguns gays mais velhos fazendo pegação, mas não me assediaram, ainda restava alterações do Ácido, sentia-me muito doido, devia estar com cara de maluco, de modo que todos eles sumiam, assim que aparecia no pedaço. Acabei não encontrando ninguém para trocar ideia. Andei muito até cansar e começar a escurecer. Quando me dei conta da hora e resolvi voltar para casa, vi que os portões do parque já estavam fechados, então tive que escalar um imenso portão de ferro, correndo o risco de escorregar, me ferir, enfim, sofrer um acidente sério num lugar deserto àquela hora da noite. Mas consegui chegar em casa são e salvo.


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