A intolerância vinda de onde não se espera
É curioso
observar, como certas pessoas, que fazem questão de mostrar, que são gente de
bem, porque são bem posicionadas e inseridas na vida social de sua área de
influência e, portanto por isso mesmo, consideradas influentes. Gente que faz
questão de exibir, que se mantêm atualizada em várias matérias e assuntos, como
por exemplo, seguem com ardente paixão as filosofias da moda, ou o movimento
estético-artístico mais de vanguarda, e também as últimas novidades em matéria
de psicoterapia, e por aí afora. Com a necessidade de precisar mostrar e exibir
que são bacanas, que são os tais, que estão por cima da carne seca. Enfim, é
gente, que acredita ainda piamente, que a propaganda é a alma do negócio, e
leva a autopromoção e o marketing de si mesmo às últimas consequências. Não
preciso dizer, que vistos assim de fora, por um observador neutro, essas
pessoas poderiam ser consideradas como sendo muito bem sucedidas, pessoas de
sucesso. Além de todos esses atributos mencionados, poder-se-ia acrescentar
ainda, que consideram-se também revolucionários, não mais na política, claro,
porque hoje em dia, ser revolucionário na política, está fora de moda. Mas
revolucionários nos costumes, que é o que importa hoje, segundo os próprios.
Pois consideram, que é preciso, que os mais ousados efetivem a sua emergência.
Em termos
filosóficos, não acreditam mais em verdades de nenhuma espécie, pois o
conhecimento é relativo, já que a realidade é efêmera e fragmentada, ou talvez
líquida, o que devem ter descoberto lendo algum filósofo de plantão da última
moda. Para eles não tem mais nenhum sentido falar em sistema de pensamento, ou
sobre o todo social, a noção de totalidade é uma falácia simplista, uma
abstração, faz parte da velha metafísica. Pois bem, caso façamos um esforço
imaginativo, para materializar alguém com o perfil acima descrito, de imediato
consideramos, que é o máximo essa criatura, que é fácil lidar com alguém assim
perfilado. Pessoas dessa estirpe devem ser bacanas, tolerantes, que jamais
julgam os outros pela aparência, já que posso ser e não ser ao mesmo tempo um
monte de coisas. Portanto estou a salvo, com toda a minha esquisitice, do
implacável julgamento dos meus pares, pelo menos por parte daqueles
considerados modernos e bacanas. Mas infelizmente não é dessa maneira, que as
coisas ocorrem e fluem socialmente. Por mais paradoxal, que possa parecer.
Justamente as pessoas, que se acham modernas na teoria, são as que têm
demonstrado serem as mais intolerantes com o diferente na prática. O fora do contexto, o
inadequado, o louco, o desajustado, o imigrante, em suma: o outro, ou qualquer
pessoa fora do padrão estabelecido, que aparentemente, pelo fato de
apresentar-se de forma diversa, é o candidato preferencial
para receber um carimbo, um crivo social, e ser vista como algo, uma coisa, já
que dizem: "Olhem! Vejam só o que ele é!". Como se o ser dessa pessoa
tivesse se reduzido a apenas um clichê. Ou pérolas do tipo: "Ora, já que
alguém pensa dessa forma, ela não me interessa mais". Mostrando dessa
maneira a dificuldade em lidar com o contraditório. Daí que, quando pessoas que
se consideram modernas, e vemos depois no dia a dia, não serem tão modernas
assim, justamente porque eram as últimas de quem se fosse esperar serem tão
intolerantes, e que viessem na prática a reforçar preconceitos de forma tão
veemente. Pois é uma enorme incoerência, confessarem o tempo todo, que não
acreditam em nada considerado definitivo, pois não creem em verdades, pelo
menos na teoria, já que se dizem céticos; e que, diante de um igual, outro ser
humano qualquer, que por acaso apresente algum sinal, por menor que seja, que
não esteja de acordo, em sintonia ou conformidade, com o ideal imaginário da
pseudo modernidade, mais que de imediato, decide-se colocar no diferente um
carimbo denunciante, um selo ou uma marca de Caim. Não literalmente, como
faziam os nazistas durante a segunda guerra, pondo a estrela de Davi nos
judeus, ou o triângulo rosa nos gays. Para em seguida, posto esse carimbo
simbólico, poder julgar, controlar, condenar, aplicar sanções com todas as
punições cabíveis, e enfim definitivamente descartá-lo para todo o sempre. Eles são imperdoáveis?
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